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segunda-feira, 8 de junho de 2015

A justiça da religião e a de Cristo

A justiça da religião e a justiça de Cristo




Não, não concordo com o uso de crucifixos como supositórios, nem alusões e representações crucificadas que deturpem de propósito símbolos da fé cristã, muçulmana ou de qualquer outra. Se não é crime, deveria ser. Mas a raiz das afrontas na Parada Gay nasceram no seio evangélico.

Sim, você não leu errado. Mas calma lá que vou argumentar.

Estamos no meio de Jerusalém, por volta do ano 30 de nossa Era. Os escribas e fariseus, mestres na Lei judaica, trazem uma mulher que traiu o marido para ser apedrejada. Jesus diz a eles : "Quem estiver sem pecado algum, que atire a primeira pedra nela". Sentou-se e viu todos saírem muxoxos sem sua justiça feita. E sobra somente ela, a mulher, à qual ele perdoa os pecados, e convida a não mais pecar.

Na cena do apedrejamento, temos dezenas de pecadores que se sentem capazes de efetuar justiça sobre a mulher adúltera, aptos a aplicar a sentença de morte cruel a ela. É a lei, veio de Deus para Moisés, e era inquestionável.

O que Jesus evidencia é que nenhum deles ali estava apto a ser executor da sentença, pois pelo fato de todos ali serem pecadores, os torna tão réus quanto a mulher em questão. Se o pátio do templo virara um tribunal a céu aberto, então a presença deles ali era como uma rendição voluntária - deveriam estar junto dela no mesmo banco dos réus.

A aplicação de sentença deles era uma justiça pobre e hipócrita, que se achava capaz de tirar a si mesmo da situação, apesar de serem tão pecadores quanto, apesar de reunirem tantas provas contra si mesmos quanto o seu alvo. São bandidos julgando bandidos usando o Código Penal.

Por isso Jesus diz, em Mateus cap. 5, que nossa justiça tem que ser maior que a justiça dos fariseus e escribas, doutores da religião, mestres dos pode-não-podes. Pois não temos como sermos nada além de réus. 

Porém se seguirmos como discípulos, imitando-o com nossa vida e ser, então Ele, Jesus, se faz fiador eterno das nossas falhas, e nos tornamos réus refugiados na Graça, refugiados no Amor de Deus, na sombra da Cruz. Sempre seremos refugiados Nele, pois nada mais temos condições de ser do que fugitivos da Ira de Deus sobre o mal que há em nossa natureza. Mas Jesus assumiu pra si essa sentença, pagando nossa dívida. Escondidos na Cruz Dele, estaremos em paz. 

Mas toda vez que tentarmos sentar na cadeira de juiz, ilegalmente atuando como "oficiais de Justiça" sobre o outro, então estaremos saindo da sombra da Cruz, estaremos achando erradamente que não somos mais réus, que somos justos para atirar a pedra. 

Só sai da sombra da Justiça de Cristo, da sombra da Cruz, quem confia em si mesmo como sem pecado. Porém "se dissermos que não temos pecado nenhum, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça. Se dissermos que não temos cometido pecado, fazemos Jesus passar por mentiroso, e a sua palavra não está em nós" (1 João 1:8-10)"

Jesus poderia ter tacado a pedra. Ele não tinha pecados. Mas preferiu a vida, preferiu ser amoroso, oferecer comunhão e Graça. 

Quando foi ser preso, após a traição de Judas, os discípulos incitaram a Jesus pra reagir. E Ele mesmo disse "voces nao sabem que eu poderia pedir e legiões de anjos desceriam para me defender?". Ele poderia, porém não o fez. Pois apesar de ser um direito Dele, Ele escolheu não exercer seu direito por amor a nós. Sem a renúncia de seus direitos, não haveria Cruz, não haveria Graça, não haveria perdão.

E nisso consiste a Justiça de Deus, pregada por Jesus, justiça que excede a dos escribas e Fariseus, doutores da religião. 
Não é na execução da sentença prevista, mas na abdicação da mesma em favor do outro, por amor ao outro. É sofrer a injustiça, por amor ao próximo. É sofrer a Cruz, por ver nela a chave da libertação do outro. 
Por isso mesmo Jesus diz: "Quem quiser me seguir, venha depois de mim, tome sua cruz e me siga. Voces ouviram o que é dito na Lei. Olho por olho. Porém eu digo a voces: se lhe acertarem uma face, oferece a outra. Se tentarem roubar sua capa, dá também tua túnica. Se lhe forçarem andar uma milha, anda duas".

Em outras palavras, além de nao podermos sentenciar, também sempre que nos sentirmos lesados por outro, devemos responder em amor, mesmo que, do ponto de vista nosso, seja justo sentenciarmos e punir à altura. Abdicar, desistir de retrucar, de devolver na mesma moeda...

Primeiro porque você é réu redimido e não tem moral pra sair de debaixo da Cruz. 
Segundo porque ao pagar o mal com o mal, não se mata ele. Apenas o realimenta. Ofensa pagando ofensa, alimenta o fogaréu da discussão. Afronta peitando afronta, apenas alimenta mais ainda um ciclo de morte, seja física, seja moral, seja de alma. Jesus nos diz pra pagar o mal com o bem, sufocando-o rapidamente, tirando do mal o combustível que ele poderia encontrar em mim. A bondade e o amor de Cristo desconcerta o mundo.

Quando Jesus cita essa lei, não é para olharmos com um olhar de condescendência falsa e piedosa aos não-crentes, como quem diz "coitados, eu sou superior na minha fé e santidade, deixe-me ajuda-los, vou oferecer a outra face pois ele é pecador tadinho"...mas sim para que saibamos como lidar conosco mesmo em relação ao outro quando nos sentimos ofendidos, injustiçados, traídos...são mandamentos reflexivos, são para dar etiqueta santa, bons modos, na tratativa entre os condenados que se refugiam na Cruz.

Jesus que é a Palavra de Deus, o Logos, não reagiu, não exerceu seus direitos de julgamento nem de castigo. Antes, aceitou ser humilhado, açoitado, rejeitado e até esquecido por homens de todas os séculos. Foi zombado. Se com o Mestre fazem assim, deveríamos esperar algo diferente para os que são discípulos?

Onde entra Malafaia e a Parada Gay?

A falsa sensação de serem procuradores de Deus, executores de sentenças celestiais, leva milhares de evangélicos a polarizarem a mídia e a política em uma Guerra Fria entre religião e movimentos tipo LGBTS. Réus de ambos os lados. Cristo oferecendo abrigo a ambos.

Aí os cristãos cutucam a onça na condição de sentenciadores, para um publico que já vive questões internas tremendas, espera apenas rejeição da sociedade, familia, Deus...gente machucada, gente assustada, gente que luta consigo mesmo...e esperam que eles retribuam polidamente?

Quando se propõe afrontas, manifestações e dedos condenadores dos líderes evangélicos - que se fizeram Papas evangélicos por nossa passividade - estamos alimentando um ciclo de morte, de pagar mal com o mal, por defesa da honra de Deus. 

Esse ciclo de morte do mal pago com mais mal, só favorece quem precisa e vive disso - pastores midiáticos e ativistas de ambos os lados. Gente que some sem escândalos semanais.

Não parece Deus precisar de advogado. Ele já deu ao mundo a  Igreja, que deveria ser manifestação da sua Graça, seu Amor, sendo Sal e Luz na vida de todos. Ele não faz questão de evitar a injustiça maior no Filho, Jesus tomou pra si as dores e condenações ao invés de mandar o mundo pro inferno....Se Jesus foi repelido, crucificado, desprezado e zombado...

Nosso bom testemunho já é uma carta viva de defesa. Esse ciclo de morte e afrontas só promove afastamento, reações cada vez mais exageradas e desequilibradas, de pastor chutando imagem de Maria, até gente fazendo crucifixo virar supositório...

Emitamos a nossa opinião sim! cobremos respeito pelos nossos símbolos sim! Mas ofereçamos ao publico todo (LGBT inclusive) comunhão, convivio em paz, sermos gente boa de Deus, anunciemos a Jesus,,,com opinião expressa mas não imposta. Com amor e abdicação em favor do outro, com misericórdia e não com justiça da religião, eles serão atraídos pelo doce perfume de quem faz a vontade de Deus,

Ensinemos sim profundamente desde nossa casa até a igreja, e crianças...pois pessoas bem treinadas nas suas doutrinas, não temem ondas de influência externas. Gera membros e crianças que sabem trocar de canal, sabem não assistir, sabem explicar...assim ao inves de tentar podar o mundo, ofereceremos a ele gente sólida e que brilha com uma luz que incomoda só por brilhar, e que aquece sem queimar ninguém. Nosso Senhor não pediu pra sermos tirados do mundo, mas para sermos salvos do mal.

Em Cristo, que podia ter reagido mas abdicou por amor e Graça,

Bruno