Há musicas sobre a passagem, há adesivos para carros. Banners bonitos no Facebook e Instagram.
Tudo posso Naquele que me fortalece,
Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus.
Fé em Deus que Ele é justo.
A comunicação é algo fascinante, a linguagem é uma coisa cheia de riquezas a serem observadas.
O uso desses adesivos é ao mesmo tempo uma placa de identidade ("Vejam, eu sou cristão") e um amuleto (para proteger-se do Mal, para "declarar" coisas). E isso faz parte da espiritualidade média do brasileiro, infelizmente também no meio evangélico. Mas o foco de hoje não é no uso dos adesivos, e sim na mensagem passada por eles.
Existe uma diferença entre aquilo que o texto diz, e o que a pessoa que colou o adesivo pensa do texto.
A grande maioria das músicas gospel, pregações e intenções ao usar esses textos, está na esperança, no otimismo, numa espécie de pensamento positivo evangélico. Por exemplo:
Tudo posso Naquele que me fortalece - Tenho dificuldades na minha vida, tenho planos e estou lutando pra conseguir isso ou aquilo, e não tenho certeza se vou conseguir superar a situação ou alcançar o alvo. Mas em Jesus eu posso, eu consigo, eu vou tomar posse, eu vou receber. Aqui o "Fé em Deus" é quase traduzido por "pense positivo".
Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus - eu amo a Deus, então todas as coisas e acontecimentos, sejam agradáveis ou não, vão terminar bem pra minha vida. No fim vai dar tudo certo e terei vitória dobrada, assim como Jó.
Fé em Deus que Ele é justo - eu sou uma pessoa do bem, uma pessoa boa, e estou (a princípio) me esforçando, e por isso Deus vai me dar aquilo que eu mereço por esse esforço, mesmo que as circunstâncias não pareçam boas ou eu veja adversários querendo me derrubar.
Não há problema algum em depositar sua esperança em Deus, confiar que Ele te ama e buscar uma vida digna. E ao longo da Bíblia vemos que Ele também se importa com nossas necessidades, nossos perrengues e perigos em vida pequena aqui. Um exemplo foi Eliseu, que para ajudar uma mulher (2 Re 6) ele faz um martelo flutuar de volta pra superfície, pois era emprestado e a mulher ia ficar numa situação difícil.
Mas essa forma triunfalista de falar pode facilmente esconder alguns erros, disfarçados com versículos bíblicos. E esses são os mais complicados de desfazer na nossa cabeça.
Primeiro - todas essas frases, embora verdadeiras, apontam para Deus como esperança. Mas esperança em quê? Os adesivos falam Dele como nossa Esperança de vida próspera e regalada, confortável, de dias melhores aqui na Terra. De superação das dificuldades e tristezas do cotidiano.
Mas embora a prosperidade seja benção Dele, e aproveitar essas bênçãos com o coração grato a Ele uma forma também de louvor, a Esperança que Cristo trouxe e oferece é sobre a vida depois dessa vida. A promessa selada com o sangue Dele mesmo, de que a Eternidade será boa, será prazerosa. De que podemos esperar, com coração animado, Sua volta ou nosso encontro com Ele direto numa nova realidade eterna. A obra da Cruz nunca foi para atrair prosperidade aos seus seguidores, mas para fazê-los Filhos junto com Ele. Somos forasteiros aqui. Podemos pedir com fé que Ele nos ajude nas urgências daqui, mas o alvo de Jesus é o Reino e a garantia de que você estará nele amanhã.
Segundo - Existe um humanismo disfarçado na interpretação dos adesivos. A de que EU tudo posso (naquilo que EU quero e EU planejo), e que Deus é o meio, a ferramenta que tornará isso possível. Quase como uma forma impessoal de divindade, uma certa "energia" que eu posso usar a meu favor. A diferença dessa conversa para os coachs quânticos e turma do GratiLuz goodvibes é o nome - um chama de Universo, outro de Deus, outro de Energia. Mas infelizmente tudo é algo que vai ao MEU favor. Há o risco de esquecermos que no Evangelho a nossa vontade é (ou deve ser) reorientada para buscar e fazer o que o Cabeça do Corpo quer, do jeito que Ele se agrada, e não o nosso gosto.
Tudo posso, mas apesar de tudo me ser lícito, nem tudo me convém, e nem tudo me edifica. E tudo posso Naquele (em Cristo). E estar em Cristo não pode incluir estar fazendo coisas ou tendo objetivos que não estejam alinhados com Ele. Estando em Cristo eu posso tudo, tudo que Ele aprova e me pede. E pra isso Ele me dá forças até sobrenaturais pra conseguir. É força sobrenatural para fazer o que Ele quer e gosta, e nada mais.
E com esses dois primeiros pontos, chegamos no menos usual e mais sutilmente perigoso.
Terceiro - O conceito das palavras TUDO, BEM , BOM, FÉ, JUSTO.
Tudo possoNaquele que me fortalece
Todas as coisas cooperampara o bem daqueles que amam a Deus.
Fé em Deus que Ele é justo.
Nosso evangelicalismo brasileiro foca bastante nas partes que nos parecem positivas. Todas as coisas cooperam pro meu bem, eu sou capaz de tudo se eu tiver fé. Mas estamos esquecendo do ponto de vista mais importante - o ponto de vista de Deus, que pelas frases, é o executor ou promotor dessas promessas.
Qual é a definição de Deus para BEM? para JUSTO? para FÉ ? é essa definição que importa para a interpretação dos versículos.
JUSTO
Pela Palavra, Deus olha para nós e não vê um justo sequer. Todos pecaram e carecem desesperadamente da Graça de Deus, pois a princípio estão irremediavelmente corrompidos e separados do único Justo e Santo - o Senhor. Somos aceitos perante Deus, por causa da companhia de Cristo ao nosso lado. Só assim somos permitidos de ter um relacionamento com Deus Pai. Fora da companhia de Cristo, não conseguimos entrar de penetra na festa do Reino. Por isso sempre oramos "em nome de Jesus", pedindo através Dele.
É como um adolescente que quer ver um novo filme no cinema, mas é para maiores de 18 anos. Ele não tem crédito para adentrar, mas se um responsável adulto entrar com ele, o adolescente pode ver o filme.
Sermos justificados não nos torna magicamente bonzinhos, instantaneamente santificados e livres da nossa natureza. É um longo processo, com altos e baixos. Leva uma vida inteira evitando atitudes e pensamentos corruptos, uma mentalidade viciada, preguiçosa e capaz de mascarar seus caprichos usando até mesmo a religião.
Se Deus for justo, e isso significa que Ele nos dará "o que merecemos", estamos danados, estamos perdidos! pois merecemos o que algo corrupto e pecaminoso merece, a separação eterna de Deus, a ira decepcionada de Deus, os céus fechados e surdos para nossa oração. Nossos dias em vida seriam terríveis e pós-vida ainda cruelmente piores.
Por isso foi preciso Cristo. Para que a Justiça fosse cumprida, que o pecado recebesse como pagamento a morte - porém outro recebeu por nós essa punição, na Cruz.
Mas somos apresentados a outros conceitos bíblicos - a misericórdia e a Graça comum. Apesar de nossa natureza, as misericórdias do Senhor se renovam a cada dia. Respiramos, nos movemos, comemos, temos chance de ouvir Sua Palavra, termos um encontro com Ele temos momentos aqui e ali de prazer e alegria. Misericórdia é Deus não nos dar o que merecemos de verdade.
Justiça é irmos pro inferno. Graça é ganharmos uma saída sem sermos capazes nem termos buscado.
BEM
Como falamos no início, o objetivo da Obra na Cruz é nos livrar do destino terrível e justiça real, nos resgatando da queda livre e nos levando pro Reino.
Um pecador que muda de rumo, como Mateus ou Zaqueu.
Um coração grato e quebrantado, humilde, que reconhece a Graça de Deus, sua bondade, reconhece sua própria pequenez e o quanto dependemos Dele. O quanto as pequenas alegrias do dia a dia são uma dádiva Dele para nós.
Não é conforto, não é ser fofo, não é estar rico ou sem problemas. Pelos textos bíblicos, o conceito de BEM é algo ligado aos objetivos do Reino e a obra de Restauração do relacionamento Deus com os homens, e restauração da natureza de cada um de nós.
Se "todas as coisas" (acontecimentos e condições) cooperam (trabalham juntos) para o BEM daqueles que amam a Deus, então cooperam para que nos convertamos dos maus caminhos. Que nos afastemos das armadilhas da nossa própria natureza. Que nos mantenhamos ativos na implantação e anúncio do Reino. Que não nos esqueçamos de Quem nos dá a vida aqui e depois daqui.
Que nos mantenha humildes e gratos pelo pão de cada dia e não aflitos pelo que não temos nem precisamos ter.
Isso é BOM, isso é BEM aos olhos de Deus.
E pra que esse BEM nos atinja, Ele vai usar todas as coisas pois Ele as criou. E esse tipo de BEM nem sempre é confortável, nem sempre é abastado ou isento de problemas. Mas é esse BEM que Deus se empenha em fazer acontecer na vida dos que O AMAM.
Então se você se enxerga nesse adesivo, saiba que o objetivo último de Deus pra você é o BEM - na visão Dele.
Veja o versículo "a Sua vontade é boa, perfeita e agradável" - a pergunta é, para quem, ou na opinião de quem? muitas vezes, essa vontade é racionalmente boa, mas não aos nossos olhos. Há momentos em que nossa carne não vai querer fazer a vontade Dele. Podemos entender como boa, como perfeita, mas chamar de agradável, somente Ele, pois não queremos nos mexer.
FÉ
No conceito generalizado do espiritual brasileiro, "ter fé" tem significado de pensar positivo, de ter esperança de que vai dar certo, de que as coisas vão melhorar. Claro que temos condições sociais e econômicas difíceis no Brasil e há muito tempo, desigualdades e barreiras que são maiores pra uns do que para outros. Pra muita gente realmente o sobrenatural é a única esperança. É fazer promessa, é fazer campanha de 21 dias, é rezar, é proferir em voz alta, o que a pessoa achar que ajuda a mover o invisível a seu favor.
Tampouco a fé significa acreditar. A bíblia diz que os demônios também creem em Deus e tremem. Conheço muita gente que precisa aprender com eles.
Mas a fé bíblica é bem diferente de acreditar ou de pensar positivo. Envolve ação, envolve ir na direção apontada. "Sai de tua tenda e vai para uma terra que te mostrarei, Abraão". É Ana ir dormir com Elcana seu marido, sabendo que era estéril até ontem. A fé deve ser como a gripe, que não tem como disfarçar e produz mudanças no corpo todo, não como maquiagem que eu uso para parecer virtuoso, piedoso, bonzinho, mas posso tirar à noite e continuar sendo o mesmo.
A fé sem obras, sem suor que a transforme em realidade, é morta.
Conclusão
Enfim, ao invés de grudar um adesivo, usar uma camiseta ou postar um baner bonito com as frases acima, pense em tudo que elas significam.
Pense no BEM que Deus quer pra você, tendo FÉ de que mais do que JUSTO, Ele é misericordioso e que você pode tudo que o Reino espera de você, se estiver Naquele que te fortalece.
Às vezes, as pessoas se inscrevem em programas, assinaturas e grupos por causa de uma pequena parte. Pode ser que você também já tenha assinado um streaming (Netflix, HBO, Amazon, etc) ou assinado TV a cabo só por causa de uma série favorita ou um canal que te interessa.
Tem vezes que eu penso em comprar uma caixa de bombom só por causa do Caribe, aquele bombom de banana, sabe?
Mas nem sempre é prudente comprar uma cesta básica inteira por causa de um produto específico. Venha pensar comigo.
Já conversamos em um outro post, sobre a nossa cidadania depois que aceitamos andar com Jesus. Mantemos a cidadania do nosso nascimento (brasileiro, alemão, etc) mas passamos a ter uma cidadania superior a essa - quando nascemos de novo em um novo Reino. Se você ainda não viu, corre lá, leia e depois volte aqui.
Para com a cidadania terrena, já vimos que temos que orar e interceder pelo país e autoridades, respeitar as leis vigentes, sermos exemplares na conduta, exceto nos momentos em que a lei terrena implique em contrariar uma lei divina.
Existem pessoas que vivem como se tivessem apenas a cidadania terrena, vivem sem prestar atenção ao que exige o passaporte do Reino de Deus - mesmo que muitas vezes sejam presentes na igreja, são cidadãos do Reino apenas no domingo, por 2h durante o culto.
Porém eu gostaria de falar sobre o outro lado da moeda. Quando as pessoas erradamente confundem as duas cidadanias - a do Reino e a civil - como se fossem uma coisa só e equivalentes em importância.
Mantenha o ouvido e a mente abertos, pois essa reflexão não é sobre esquerda ou direita. Eu quero discutir o quanto temos certeza de estarmos usando bem a mordomia do que Deus nos deu, em prol do Reino Dele - e por nenhuma outra causa. E é "facinho, facinho" de perdermos o alvo.
Muitas vezes, os movimentos humanos tentam grudar no Evangelho um sentido ideológico, político, como se fosse um sinônimo. "Pensou na nossa causa/bandeira/partido, pensou em cristianismo". Como se uma coisa automaticamente levasse à outra. Como se para comprar feijão, você precisasse comprar a cesta básica toda e consumi-la.
Ou então lideranças religiosas que, em troca de apoio financeiro, apoio às pautas morais, ou proteção contra a pressão dos costumes "do mundo", acabam procurando o poder político - mesmo que os tais políticos/partidos tenham histórico questionável, condenações ou sejam investigados por envolvimento com coisas/pessoas erradas.
Historicamente isso nunca funcionou bem. Claro que poderíamos falar aqui dos clichês, como as Cruzadas, ou a indecente barganha que a Igreja na Idade Média fazia para validar reis em troca de ter proteção, influência e tributos. Ou mesmo reformadores protestantes que causaram um inferno na vida daqueles com divergências teológicas.
Mas essa confusão entre projeto político e cidadania do Reino já vem muito antes das Cruzadas, na verdade desde o momento que Jesus inicia seu ministério.
Desde os tempos de Jesus
As autoridades do Templo conspiraram contra Jesus pois a agitação popular atrairia a atenção do império romano (Jo 11:45-50), atrapalhando a relativa autonomia que gozavam junto aos romanos, o pequeno poder regional que acumularam iria se esvair.
Nao por acaso, outro personagem da mesma época aparece com suas motivações políticas fundidas com as religiosas - Judas, o traidor. Ele era chamado de Iscariotes - o mais próximo que os falantes de latim de Roma conseguiam chegar da palavra "sicário". Os sicários eram uma divisão extremista dos nacionalistas zelotes, eram rebeldes separatistas, que queriam a independência e o fim do jugo romano, e andavam com adagas escondidas (chamadas de 'sicar') com o qual cometiam atentados discretos nas ruas e becos, especialmente contra as autoridades romanas e outros judeus "traidores" que ajudavam os romanos, causando medo, eram revolucionários que praticavam terrorismo, para deixar qualquer guarda romano preocupado de sair de casa.
Adaga sicar, usada pelos terroristas
os sicarios eram os terroristas da época
Quando Judas percebeu que o movimento no qual ele era parte não iria para a direção da revolução, da revolta popular contra Roma, tratou de negociar sua traição com o outro poder vigente - as autoridades do Sinédrio. Para ambos, Jesus e o Reino eram empecilhos, mesmo que o projeto político de Judas fosse oposto ao Templo (um queria manter a "boa relação" com Roma, outro queria separar-se dela).
E para o Sinédrio, era plenamente aceitável quebrar várias leis do Reino, vários princípios morais, em nome do seu projeto político: financiar uma traição, agredir e condenar um inocente, terceirizar a execução de morte para os romanos dando falso testemunho, subornar os guardas para que mentissem sobre a ressurreição do corpo de Jesus, coagido um cego recém-curado (veja nas referências no fim do texto). A Lei de Moisés proibia matar, mas Judas também estava disposto a ignorar esse mandamento em prol da sua visão político-religiosa. Quando o homem busca fora do Reino uma forma de implementar o "reino de Deus" do seu próprio jeito, acaba passando por cima das regras do próprio Reino que ele diz defender.
Em ambos os casos, a cidadania principal - a do Reino - foi rebaixada e misturada com o projeto político-civil que tinham em mente. O sinédrio defendia a continuação do regime opressor, e Judas era o que queria a revolução social, derrubando o opressor, mesmo que a custa de sangue e medo.
Nós vemos também no caminho para Emaús, o lamento dos dois homens que não perceberam Jesus andando com eles. Lamentavam pois achavam que Jesus era o Ungido de Deus que iria redimir, resgatar Israel das mãos dos romanos, como um novo rei Davi, guerreiro e vitorioso. Eles não esperavam um messias cordeiro, sacrificando-se. Como a expectativa deles estava muito carregada de significado político, não foram capazes de enxergar o Mestre. Só o perceberam quando Ele lembrou a eles o que importava no Seu Reino, quando partiu o pão e deu graças. O Reino não era político, visível, com exército e bandeira. Era um Reino que crescia no coração das pessoas, no partir do pão, na vida diária correta, como um fermento que vai levedando toda a massa.
O próprio apóstolo Pedro, zelote que era, também via o Reino com olhos politizados - a ponto de atacar Malco, o assistente do sacerdote durante a captura de Jesus no Getsemani, e arrancar a orelha de Malco. Ao que Jesus repreende, cura a orelha cortada, e diz : "se eu quisesse, pediria ao meu Pai para mandar 12 exércitos de anjos para nos defender" ou em outras palavras "não é esse o meu projeto, não é assim que o Reino funciona". Pedro também teve que aprender que o Reino veio para os gentios, e não apenas para Israel - no famoso episódio de Cornélio, na visão de lençóis cheio de seres rastejantes e impuros.
Pedro ainda teve mais um episódio, em Mc 8 quando, logo após reconhecer que Jesus era o Cristo Filho do Deus vivo, também repreende Jesus discretamente, quando Ele anunciou que haveria de morrer. Ao que Jesus diz "Arreda-te Satanás! Pois você não está preocupado com as coisas de Deus, mas com as coisas dos homens". E ao ligarmos esse episódio com Emaús e o Getsêmani, é bem provável que Pedro estivesse repreendendo o anúncio da morte de Jesus em nome da retomada do poder, do Ungido vencedor, do novo Davi - da esperança política dos judeus. Em outras palavras, "Ei Mestre, não fale assim, o senhor não vai morrer, o senhor tem que libertar Israel".
É justo comentar: os judeus entendiam desde os tempos do Antigo Testamento, a noção de povo escolhido, religião e nação como uma coisa só. Através da circuncisão e conversão, qualquer pessoa passava a ser parte da vida religiosa e davida civil. Nao havia separação naquela época. Porém na Nova Aliança, o Reino deixa de ser visível em terras conquistáveis, ocupáveis, para ocupar metros quadrados nos corações de gregos, romanos, judeus, samaritanos e brasileiros como eu e você.
Nao é mais um projeto político e civil. Esse projeto parou em Salomão - dali pra frente seus descendentes pecaram tanto (vide os relatos de Isaías e Jeremias) e foram tao violentos, que o reino se dividiu em Norte (Israel) e Sul (Judá), e Deus entregou ambas para o cativeiro - pelos impérios assírio e babilônico. Depois foram subjugados pelos Persas, e por último pelos gregos (macabeus) antes de Roma.
Mas ao invés de converterem-se dos maus caminhos, mudar de rota e arrependerem-se, as gerações perversas depois de Salomãopreferiram confiar na ajuda política do Egito, e falharam miseravelmente.
O caso da Prússia
Prússia começou pequena, em vermelho e chegou a dominar quase toda a Alemanha
A Alemanha historicamente nunca foi unificada. Por séculos, a divisão entre leste e oeste era forte, muito antes da Guerra Fria, Muro de Berlim, ou mesmo da Reforma. As regiões do Oeste (Colônia, Mainz, Frankfurt, Düsseldorf, etc) sempre foram alinhadas com o ocidente, amigas dos EUA, da Inglaterra, cheias de comércio e muitas indústrias - e historicamente, também muito católicas. Essa região chamava-se desde antes de Cristo, de Germania. Durante as Cruzadas, uma parte da Ordem Teutônica dos Cavaleiros (a versão alemã dos Templários) se alocou no nordeste da Alemanha formando um novo estado - a Prússia. Esse estado formado por ex-cavaleiros e nobres sempre foi da agropecuária, com muitos títulos mas sem dinheiro, sem indústria, mas extremamente militarizada, agressiva, defensora das estruturas tradicionais da época dos reis (Kaiser). Os Junkers, como eram chamados os nobres da Prússia, gostavam de andar armados, uniformizados, duelar - com revólver ou na espada - em nome da honra e das tradições. Eles odiavam o Oeste cheio de dinheiro e apoiadores dos ingleses. A Prússia considerava a Germania um bando de frouxos, burocratas almofadinhas, traidores da pátria, puxa-sacos dos estrangeiros, aliados da França, Inglaterra, e vendidos sob a influência do Papa. Nao eram "alemães de verdade".
Junkers da Prússia
A Prússia se via como a defensora do nacionalismo, e como forma de banir influências externas, ela adotou no seu "pacote" o protestantismo - segundo eles, a verdadeira religião do "alemãoraiz" deveria ser um cristianismo genuinamente alemão (de Lutero), sem as "terríveis influências de Roma e dos judeus". Assim, a Prússia criou uma ligação que confundia fé com patriotismo alemão. Ser prussiano era ser automaticamente protestante, e vice-versa, não tinha mais a ver com a identificação pessoal, era praticamente uma obrigação cultural.
Como se pode ver, a Prússia era a versão 1.0 do que seria o Nazismo 60 anos depois: nacionalismo exagerado, fascínio por fardas e militarismo, um forte anti-semitismo, mau uso das patentes ("sabe com quem você está falando?"), um forte discurso pela tradição e contra "o declínio da sociedade moderna" - enquanto na prática eram agressivos, autoritários. Olhar para Otto von Bismarck da Prússia e sua trajetória política, é ver uma versão século 19 do "bigodinho da suástica" do século 20.
E essa cooptação do protestantismo como "religião do alemão de verdade" seguiu forte até os anos 1930, quando o "bigodinho" subiu ao poder. Pra nossa tristeza, o fator que desequilibrou a eleição de 1933 foi justamente o voto dos estados de maioria protestante. Apenas 17% dos eleitores pró-Hitler eram católicos, ou seja, 83% eram protestantes orgulhosos. Veja o mapa do censo da eleição e da religião na época:
O mapa dos eleitores pró-nazismo (esquerda) foi praticamente o inverso do mapa católico (direita)
Como se pode ver, o pacote da Prússia tinha vários valores e atitudes que não combinavam com o Evangelho. Não buscavam a paz, entraram em várias guerras para se expandir, tinham um discurso e atitudes violentas. E ao associar a fé com o nacionalismo, com o seu programa político, a Prússia jogou o protestantismo no meio da maior tragédia do século XX. Claro que houve exceções e grandes figuras evangélicas (e católicas) resistiram e até foram presos (e mortos) pelo regime nazista. Mas a participação protestante durante as eleições foi muito relevante. Nao atentaram para o resto dos "produtos na cesta básica prussiana".
Mas infelizmente não é apenas na Prússia nacionalista e moralista do séc 19 que o problema apareceu. Essa confusão entre agenda política e Reino não tem lado político.
Antes de tudo deve se ter cuidado ao falar em definição de "esquerda" ou "direita" - se estamos falando de esquerda como apoio ao necessitado, suporte do Estado em políticas sociais, repúdio ao racismo e outras discriminações - ou se estamos falando de esquerda enquanto costumes progressistas ou revolução armada contra o governo. Sao aspectos diferentes que podem ou não dialogar com o Evangelho.
Um exemplo é a Teologia da Libertação (TL), que tem uma justa e necessária ênfase na assistência social e defesa dos mais fracos, da justiça social. Afinal, a própria Bíblia defende que "a verdadeira religião pura e imaculada pra com Deus é esta: visitar os órfãos e as viúvas na hora da necessidade, do apuro, e guardar-se dos costumes do mundo" Tg 1:27.
Mas a TL teologicamente acaba por ser um recorte pobre do Evangelho e frequentemente se associa aqui e ali, com grupos e bandeiras que historicamente nada têm a ver com o resto da agenda do Reino e valores morais bíblicos. O único ponto em comum com estes movimentos é a obra social, mas por causa de "um produto na cesta" a TL acaba com isso se abrindo e se diluindo com outras cosmovisões fora da Bíblia - acaba comendo os demais produtos, e produzindo teologias "temáticas", submetendo a interpretação da Bíblia aos olhos das bandeiras e movimentos sociais, ao invés de interpretar as conclusões sociológicas a partir da Bíblia.
Também é desnecessário citar que muitos destes movimentos sociais pouco criticam (isso quando não apoiam abertamente) governos totalitários e regimes sem liberdade. Ditadores, terroristas, figuras que não tem conexão com o caráter de Jesus - sendo muitas vezes os primeiros a perseguir os cristãos nos seus regimes.
Para o pensamento revolucionário, é absolutamente válido o uso de revoluções, insurreições, desobediência, e violência para atingir seus objetivos. Paredão de fuzilamento, campos de trabalho forçado, delação dentro da própria família, guerrilhas, insubordinação e revolta popular, revolta contra o governo vigente. Também é muito comum a incitação ao rancor contra grupos: a classe burguesa, o patronato, o patriarcado ou qualquer outra fatia que se interprete como acumuladora de poder - a ponto de se empobrecer o lidar com o outro, tratando-o com barbárie, justificando qualquer violência, por ordem do movimento, da bandeira, do partido - nada menos do que uma "retribuição do oprimido". Nada disso tem lugar no Reino, mas encontra-se na História de várias tomadas de poder "em nome do povo" e na formação das "repúblicas democráticas/populares" pelo mundo.
Também é óbvio que a pauta progressista dos costumes também está em rota de colisão com muitos posicionamentos bíblicos. Muitos movimentos progressistas são abertamente contrários e ácidos ao evangelho e os cristãos - pois consideram a pauta de costumes cristã um dos pilares da super-estrutura que atrapalha a revolução e despertar das classes sociais. Outras vezes consideram a família bíblica um núcleo perpetuador de opressão.
Porém uma discussão mais ampla sobre a compatibilidade com o que se entende por esquerda vai ser publicada aqui, mas pra não alongar, ficamos com o acima falado.
Porém o mais preocupante não está no lado progressista, e sim no lado ideológico cuja pauta de costumes diz ser bíblica - ou pelo menos não é abertamente contrária. O perigo está no que é parecido, naquilo que é supostamente compatível. Eu não preciso alertar você, enquanto dirige, de não bater o carro no elefante colorido no meio da rua. Você vê o grotesco, aquilo que é "gritante".
O urgente é falar do sutil, do buraco na estrada de noite, que parece ser parte do asfalto mas não é - e ao passar a toda velocidade, pode quebrar sua roda e bater o carro.
Lembre-se: ser (supostamente) compatível não é ser igual ou equivalente, de igual importância. Ter pontos em comum não é ser idêntico ou equivalente. E mesmo essa coisa de "ser compatível" ou os tais "pontos em comum" precisam ser confirmados!
O modelo e o movimento
Veja, que nem mesmo os diferentes modelos de igreja dentro da mesma linha teológica, nem as várias estratégias de implantação de igreja conseguem ser representações plenas do Reino, como se fossem sinônimos - muitas vezes elas acabam ecoando problemas e defeitos bem humanos - sendo o ego ou a vaidade um exemplo - pois por mais bem intencionadas que sejam, as modelagens são humanas.
Nem mesmo teologicamente a gente consegue envolver e sistematizar todos os aspectos lógicos e práticos do Reino de maneira unificada - temos diversas formas de organização como presbiterianos, batistas, congregacionais, pentecostais clássicos, etc. E todos se veem como buscadores legítimos da implantação desse Reino.
Porque raios um modelo político ou ideológico, um partido ou um movimento social seria capaz de bater no peito e se dizer representante desse Reino, de englobar ele dentro de sua agenda ou bandeira?
Se nem mesmo as igrejas - cuja missão e prática teoricamente brota diretamente do esforço de interpretação das Escrituras - conseguem estar livres de misturar os objetivos de Deus com os objetivos pessoais/humanos, como podemos aceitar misturar ou igualar projeto político-partidário com Reino de Deus?
Isso porque o Reino não é um edifício de dogmas e teologias sistemáticas perfeitamente encaixadas. Nao é sobre a pintura, é sobre o processo de pintar e ser usado para pintar. Nao é sobre a correta crença, é sobre a correta crença em movimento, fazendo esse Reino e seus frutos brotarem num mundo árido, injusto e pervertido, que não precisa de ajuda pra se estragar e transformar tudo em fonte de morte. Crer até mesmo os demônios crêem - Tiago 2:9.
A água corrente é vida, leva nutrientes, move os engenhos, rodas d'água e assim produz trabalho, transformação. O Reino enquanto "escultura perfeita" e estática não é Reino, é tao útil ao faminto como o retrato de uma feijoada ou um prato com foto de comida.
O prato é medicamente correto, instrutivo, mas não mata a fome
O reino de Deus brota como resultado de uma igreja que entende que é a Roda D'água de Deus na Terra - seguindo o mesmo ciclo que vemos tantas vezes nas vidas transformadas na Bíblia: consciência, arrependimento, mordomia, santidade, testemunho, envolvimento. No fim dessa sequência, mais pessoas são tocadas em sua consciência e maior fica o Reino, mais frutos ele passa a gerar no seu derredor.
Eu recomendo você por curiosidade ver esse vídeo abaixo. Mostra o moer da erva mate para quem curte um tererê ou chimarrão. A erva é moída por vários pilões que são erguidos pelo movimento que a roda d'água recebe do rio do lado de fora. Eu fui pessoalmente visitar esse lugar em Bento Gonçalves-RS. Na história da Humanidade isso também serviu para moer cereais, bombear água para terrenos altos, etc.
Por isso, não podemos aceitar que outra coisa além das Escrituras, outro alguém além de Cristo ali mostrado, sejam nossos exemplos. Aquilo que o meu líder ou político preferido diz, o que a bandeira do movimento professa, o exemplo (bom ou mau) que ele dá, tudo isso não pode me levar com a mesma força que os valores e princípios do caráter e prática de Jesus.
Pra nós, não pode haver outra profissão de fé que não seja em Cristo. Nada nem ninguém outro pode causar em nós um gasto de tempo e energia que não seja na direção do Reino e em nos tornarmos a cada dia mais parecidos com Jesus. Nada pode nos mover na direção do outro humano que não seja como vendo nele o meu próximo, tendo eu como o primeiro contato com Jesus que ele vai ter - e isso depende do quão "Jesus" eu tenho sido.
Se eu sou capaz de ir atrás do outro pra provocar, brigar, gastar emocional e psicológico, tempo, dinheiro, entao eu já estou fora do foco como embaixador desse Reino.
Se eu gastarei tempo, energia, VIDA, vai ser em nome do Reino - e de mais nada.
Botando o irmão no pacote
A "cestificação" é uma simplificação, que afeta inclusive nossa comunhão e testemunho.
Somos levados a encarar o outro, o que aderiu ao pacote diferente do nosso, não mais pela ótica do Reino - como irmãos de caminhada crista ou que precisam conhecer a Cristo, não como meu próximo, como Jesus explica - mas como inimigo, como alguém que eu preciso derrubar, calar, contradizer com toda força, pois é uma ameaça ao meu pacote/bandeira.
Já automaticamente rotulamos a pessoa com todos os adjetivos e xingamentos que "esse tipo de gente" merece. Nao importa quem ela é ou foi na nossa vida, ou se acabamos de conhecer. Se é apoiador do outro lado, automaticamente é coberto com o manto da rivalidade, escondendo toda a sua identidade única, sua história de vida, e até mesmo suas limitações pessoais. A fusão de cidadania do Reino com a cesta política literalmente coloca "todos numa mesma cesta" e nos leva a ver o outro como "tudo farinha do mesmo saco".
A "pacotização" (ou "cestificação", chame como quiser) desumaniza o outro, poe nele um rosto genérico e o chama de adversário, de inimigo, um símbolo, um ser abstrato que ameaça minha posição ideológica. E é fácil odiar símbolos e coisas abstratas.
Faz do próximo um ser sem nome, sem história, sem necessidades que eu como cristão posso suprir, e sem dons e talentos que Deus possa usar para me curar e edificar.
Agora é um alvo vivo para eu descarregar toda a minha "munição", todas as explicações prontas, as frases de efeito, gritos de protesto e as notícias salvas no meu celular.
Nao é mais o Fulano/Fulana
Com certeza essa é uma lente que nada tem a ver com o Reino de Deus, onde o relacionamento com Jesus tem uma dimensão pessoal, o milagre é pessoal, e a dimensão coletiva é curar e sermos curados, edificar uns aos outros.
Em Gálatas 3, nos é dito que no Reino não há mais grego ou judeu, rico ou pobre, escravo ou livre. Essa divisão, essas "cestas" criadas pelo ser humano não são mais parte da lente do cristão. Então porque é que deveríamos tolerar ou mesmo incentivar que retornem?
Ou será que nosso comportamento por causa da política tem trazido "inimizades, brigas, acessos de raiva" (Gl 5:20)?
O único alvo que o próximo pode ser no Reino, é alvo das nossas intercessões, amor e pregação, alvo do nosso exemplo, testemunho, e atenção.
O que aprendemos da História
Essa fusão entre Reino e política, esse sequestro da fé para usos políticos - ou a busca da política como forma de se proteger e ganhar força é perigoso.
Faz com que o homem e a mulher cristãos comecem a considerar que o sucesso político de um grupo signifique o sucesso da parte espiritual - como na Prússia, é "natural que a gente escolha esse lado" ou "todo cristão tem que apoiar essa bandeira/partido". E isso muitas vezes levou cristãos a adotarem/buscarem partidos, candidatos e bandeiras que alardeavam serem defensores do Reino ou de terem no seu governo, objetivos "cristãos".
Tiveram que aceitar a cesta completa por causa da promessa de ter um produto específico dentro.
Mas veja - basta 3 mL de vacina para proteger, ou 3 mL de veneno para tornar um balde de água em algo refrescante mas mortal.
Veja algumas consequências dessa confusão/fusão de lado político com religião:
1) permitir-se polarizar e radicalizar a ponto de negar a própria prática cristã em nome do pacote que compraram - são capazes de brigar, atacar, magoar e isolar o próximo (mesmo dentro da igreja!) em nome do lado político que escolheram. Se tornam diabos na vida dos outros, quando deviam ser benção e refrigério.
2) tolerar ou incentivar práticas de mesma raiz pecaminosa (p.ex. violenta, mentirosa, inflamatória, questionável) desde que para "defender o nosso lado". Nessa hora eu lembro de Jesus perguntando aos discípulos violentos "de que espírito vocês são?" (Lucas 9:55)
3) acreditar que um lado ou viés ideológico humano seja capaz de representar o Reino e seus valores, misturando escatologia espiritual com utopia política: quando a agenda política estiver 100% implementada, o Reino estará implantado e o mal, vencido e de mãos atadas.
4) Adotar um(a) ungido(a) dessa agenda, que deve ser defendido(a) a qualquer custo. Quando ele tiver 100% de poder, ele poderá finalmente fazer o que estava "predestinado" a fazer por nossa causa. Se el vai preso, é um mártir. Se resiste, é um herói. Se é investigado, é perseguição do mal - e não uma averiguação em prol da transparência. E se visivelmente erra, foi por amar demais a causa e defender o bem.
5) Quando o item 3 e 4 acontecem, toda igreja local se torna uma suposta fonte de implantação e pregação do "reino" - neste caso um conceito maculado de Reino - um reino implantável por esforço e intelecto humano e na força da ideologia e não do Espírito.
6) Dizem que compraram o pacote por estarem preocupados com os valores do Reino mas sequer os cultivam diariamente em seu lar e vida privada. Diz defender a família, mas dentro de casa a dinâmica já se deteriorou bem longe da práxis da Palavra e há abundância de pecado e suas conseqüências, de desrespeito, agressividade, chantagem, abuso, vergonha, vícios, etc. É como um homem que reclama que não tem chovido mas bem horta ele tem, apenas terra rachada. Pode-se dizer que muitos que gritam e compram "pacotes políticos" em defesa da família cristã não tem "lugar de fala" pois tampouco passariam no crivo da Palavra.
7) Como o conceito de Reino e de messias estão corrompidos, a crítica ou divergência política vira uma divergência teológica velada - afinal pra eles a realização do político implica no sucesso do espiritual. E os candidatos e seres políticos sabem bem como fazer o espiritual ser (nominalmente) parte da campanha, misturando e contaminando conceitos.
8) por causa do item 1, 2 e 4, está disposto a por em risco a comunhão, a convivência pacífica do Corpo, a brigar ou mudar seu jeito de ver ou viver com outro irmão por causa de política. Ou seja, rasgam a cidadania do Reino por causa da cidadania terrena!
9) até a teologia acaba por ser alterada, revista, para dar suporte "bíblico" a agenda política.
Pode ver que os itens acima se aplicam à qualquer lado político - da esquerda à direita, está todo mundo errado na maneira de lidar com essa fusão perigosa.
Aprendendo com os erros
Aqui neste texto eu não estou olhando para lado A ou B, esquerda, direita ou centro. Eu estou analisando o que a falsa equivalência entre fé e agenda política fizeram e quais frutos produziram. É você que tem de analisar a cesta e escolher nas urnas.
Seja na direita ou na esquerda, de Mises a Marx, existe um alvo errado - a ação, as justificativas e a esperança estão todas apontando para a plena realização da cartilha, da bandeira, do movimento. A escatologia é política e não mais do Reino.
Temos que resistir a tentação de antecipar o Reino na Terra através de atalhos humanos. O Diabo fez isso com Jesus no deserto. Sem precisar passar pela ansiedade do Getsemani, nem a dor da Cruz, nem a breve separação entre ele e o Pai para pagar nossos pecados. Bastava se dobrar ao diabo e seu pacote.
O poder absoluto sobre os reinos - algo que Jesus tem por direito na sua volta - estava a um ajoelhar de acontecer.
O assombro e adoração de todos os povos estava ali, no convite do diabo para Jesus dar um show público se jogando do alto do templo, para os anjos criarem um espetáculo de salvamento.
Bastava seguir o "jeito do diabo" de usar o as coisas legítimas - comprar o pacote.
Se você parar pra refletir, esses pacotes humanos tem grande apelo pois não exigem uma mudança profunda em todas as áreas como faz o Evangelho. Normalmente apelam apara alguns valores morais, algumas tradições, e em outras áreas são relaxados ou omissos. Cobram alguns posicionamentos e exigem pública profissão de fé - no partido, no(a) candidato(a).
Por exemplo, defendem o casamento no formato bíblico, mas não seguem a cartilha toda - como amar a esposa tao profundamente como Cristo amou a igreja, a ponto de dar a vida por ela, protege-la, desenvolve-la, ter intimidade como um só corpo e propósito. Daí acontecem aberrações como pastores com amantes e violentos com o cônjuge, mas gritando na Marcha para Jesus. Gente de igreja aparecendo em investigações por mau uso de cargos públicos. Mas pra eles a verdadeira ameaça ao santo matrimonio é "o mundo".
Nós deixamos que nossa visão política ou ideológica se torne pra gente, algo salvífico, e lutar por isso se torna uma batalha apocalíptica - para implantar nossa ideologia e trazer o Céu, e pra evitar que a ideologia oposta traga o inferno.
Nao é mais o bom combate. É uma guerra externa, que nos distrai do nosso maior inimigo - o pecado, pronto na nossa carne pra brotar. E ironicamente, essa guerra externa aflora e provoca o pior latente de nós.
Aquilo que está previsto na Bíblia - a igreja sendo perseguida século após século por não aderir aos costumes do mundo - vai acontecer. Aliás só vai acontecer se a igreja fizer o que o Senhor da Igreja nos pede, se buscarmos santidade, mordomia e honrar a Deus na vida privada e pública. Trazendo luz, paz, frutos do Espírito a toda a sociedade, sem abrir mão dos nossos princípios bíblicos. A Igreja não vai trazer o Reino ao mundo por meios humanos, e sim pelo testemunho, pela pregação e exemplo nos relacionamentos diários!
Temos de olhar bem de perto, e ver as incoerências nos pacotes, nas ideologias, como discursos violentos, "ódio do bem", complôs, desvios de verba, ameaças, associações com criminosos ou lobbies anti-éticos (ou mesmo ilegais) com empresas.
Mas atenção em quem você apoia abertamente: o mau testemunho de alguém público que se declara cristão é mais prejudicial à igreja do que a perseguição de um ímpio - pois deste ninguém espera nada realmente diferente "do mundo".